Braid

2. Tempo e Perdão

  • Tim anda à procura da Princesa para a salvar. Ela foi raptada por um monstro horrível e malvado.

    Isso aconteceu porque o Tim cometeu um erro.
  • Não apenas um. Ele cometeu vários erros durante o tempo em que estiveram juntos, todos esses anos. As memórias da sua relação desvaneceram-se, estão totalmente alteradas, mas uma imagem ficou marcada: a Princesa a virar-lhe as costas bruscamente, a trança dela a baloiçar de contentamento.
  • Ele sabe que ela tentou perdoar. Mas quem consegue esquecer uma mentira, uma traição? As relações mudam irreversivelmente com um erro assim, ainda que nós tenhamos aprendido com os nossos erros e não os voltemos a repetir. Os olhos da Princesa estreitaram-se. Ela tornou-se mais distante.
  • O nosso mundo, com as suas regras da casualidade, treinou-

    -nos para sermos tacanhos com o perdão. Se perdoarmos demasiado depressa, podemos magoar-nos muito. Mas se aprendêssemos com os erros e nos tornássemos melhores por isso? Não deveríamos ser recompensados por essa aprendizagem ao invés de sermos castigados pelo erro?
  • E se o nosso mundo funcionasse doutro modo? Suponhamos que lhe poderíamos dizer: “Não queria dizer o que te disse”. E ela responderia: “Tudo bem, eu percebo”, e não se iria embora, a vida iria continuar como se nunca tivéssemos dito nada? Poderíamos eliminar os danos, mas mesmo assim aprender com a experiência.
  • O Tim e a Princesa passeiam pelo jardim do castelo, rindo, dando nomes aos pássaros coloridos. Os seus erros estão escondidos um do outro, presos entre o passar do tempo, seguros.
Resposta

Lamento, mas a Princesa está noutro castelo.


3. Tempo e Mistério

  • Tim deixou a Princesa há todos esses anos. Ele beijou-a no pescoço, agarrou a sua mochila e partiu. Ele lamenta tê-lo feito, até um certo ponto. Agora encetou uma busca para a encontrar novamente, para mostrar que sabe o quão triste foi, mas também para lhe dizer quão bom.
  • Durante muito tempo, julgou que estavam a cultivar a relação perfeita. Ele foi ferozmente protetor, pondo um fim a todos os seus erros antes que estes afetassem a Princesa. Do mesmo modo, mantendo com rédea curta os seus próprios erros, ela sempre lhe agradou.
  • Mas estar-se à vontade com o conforto de um amigo é uma forma de existência com graves consequências. Para te agradar totalmente, ela tem de te compreender totalmente. Não podes por isso desafiar as suas expectativas ou estar fora do seu alcance. A benevolência dela circunscreveu-te e os feitos da tua vida não irão para além do mapa que ela esboçou.
  • O Tim tinha de ser não manipulável. Ele precisava de uma esperança de transcendência. Ele precisava, por vezes, de ser imune ao toque terno da Princesa.
  • À distância, Tim viu um castelo onde as bandeiras se agitavam, mesmo quando não havia vento, e onde o pão na cozinha era sempre quente. Um pouco de magia.
Resposta

Ena… isto foi muito estranho. Pois a Princesa…
… Qual Princesa?
Ela deve estar noutro castelo.


4. Tempo e Lugar

  • Ao visitar os pais para uma refeição festiva, Tim tinha a sensação de regressar àqueles idos anos em que vivia com eles, oprimido pela sua insistência em defender estranhos valores que, para si, não tinham significado. Naquela altura, as discussões surgiam como salpicos de molho na toalha da mesa.
  • Fugindo, Tim caminhou pelo ar frio em direção à universidade em que estudou depois de sair da casa dos pais. Ao distanciar-se daquela casa problemática, sentiu a vergonha da infância a desvanecer-se no passado. Mas agora entrou em todas as inseguranças que sentiu durante a universidade, todo o pânico de andar numa corda bamba social.
  • Tim só se sentiu aliviado depois de a visita terminar, ao sentar-se em casa no presente, mergulhado no contraste: viu o quanto tinha melhorado desde então.

    Esta melhoria, de dia para dia, fazia com que estivesse cada vez mais perto de encontrar a princesa. Se ela existir – ela tem de existir! – vai transformá-lo, a ele e a toda a gente.
  • Na busca, ele sentiu que todos os lugares avivam uma emoção e que todas as emoções evocam uma memória: um tempo e um local. Não poderia ele encontrar a Princesa agora, esta noite, vagueando apenas de lugar em lugar e vendo como ele se sentia? Um rastro de sentimentos, de respeito e inspiração deveriam conduzi-lo a esse castelo: no futuro, envolto nos braços dela, o odor dela enche-o de contentamento, cria um momento tão forte que ele se consegue lembrar dele no passado.
  • Sem demora, Tim parte na manhã seguinte em direção ao que quer que o novo dia lhe guardasse. Sentia uma espécie de otimismo.
Resposta

Estás a ouvir? Sinto muito, mas a Pr…
Então, onde vais?


5. Tempo e Decisão

  • Ela nunca compreendeu os impulsos que o guiavam, nunca sentiu a intensidade que, ao longo do tempo, esculpiu linhas no rosto dele. Nunca esteve o suficiente próxima dele mas ele tinha-a como se estivesse, sussurrava-lhe palavras ao ouvido que apenas uma alma gêmea deveria ouvir.
  • Após o jantar, ambos sabiam que tinha chegado o momento. Ele terá dito: “Tenho de ir procurar a Princesa”, mas não era preciso. Deu-lhe um último beijo, pôs a mochila ao ombro e partiu.

    Ao longo de todas as noites que se seguiram, ela continuava a amá-lo como se ele tivesse ficado, para a reconfortar e proteger, Princesa maldita.
Resposta

Olá… estou perdido. Estás bom?


6. Hesitação

  • Talvez num mundo perfeito, o anel fosse um símbolo da felicidade. É um sinal da devoção incessante: ainda que nunca encontre a Princesa, ele nunca vai desistir. Ele continuará a usar o anel.
  • Mas o anel denuncia a sua presença. Este brilha para os outros como um sinal de aviso. Este abranda a abordagem das pessoas. Suspeita, desconfiança. As interações são inutilizadas antes de Tim conseguir falar.
  • A seu tempo ele aprende a lidar com os outros cautelosamente. Ele acompanha o seu passo hesitante, traçando um caminho através das suas defesas. Mas isto esgota-o e só funciona até um certo ponto. Não lhe dá o que ele precisa.
  • Tim começa a esconder o anel no bolso. Mas ele mal o suporta: demasiado tempo escondida, essa parte dele pode sufocar.
Tim quer viver o anel. Ela se fascina com o brilho e poder que por ninguém é visto. Tim precisa de alguém que aguente olhar diretamente ao anel.
Resposta

Demoraste tanto tempo a chegar aqui! Mas agora posso dizer-te que…
A Princesa deve estar noutro castelo. Eu nunca a vi…
Tens a certeza de que ela existe?


1.

  • Num café, numa praça iluminada, a maioria dos clientes recosta-se, sentindo o calor do sol e saboreando as suas bebidas frescas. Mas não Tim, ele mal dá pelo sol, não consegue apreciar o seu café. Para ele, este canto permite uma boa vista da cidade e, no movimento dos transeuntes, no arco da mão de uma empregada enquanto ela mostra chá a um cavalheiro interessado, Tim espera ver pistas.
  • Nessa noite, no cinema, aventureiros fictícios precipitam-se sem plausabilidade pelo ecrã. O público aqui está misturado. Alguns são clientes do café, agora sentados entusiasticamente nas cadeiras luxuosas, ansiosos por um novo sabor, por uma distracção do aborrecimento das suas vidas fáceis. Noutros lugares encontra-se pescadores e agricultores, ansiosos por esquecer a lida e descansar as suas mãos.
  • Tim também está aqui, mas está a investigar o brilho nos lábios no ecrã, medindo o ângulo da nuvem de pó de um distante acidente de helicóptero. Ele crê distinguir uma mensagem. Quando o cinema fecha e a maioria das pessoas desce pela praça em direcção ao Sul, Tim segue para Norte.
  • As pessoas como Tim parecem viver contrariamente aos outros habitantes da cidade. Marés e correntes, a fluir uma contra a outra.
  • Tim quer, sobretudo, encontrar a Princesa para a conhecer enfim. Para Tim isto seria momentâneo, desencadeando uma luz intensa que envolve o mundo, uma luz que revelo o segredo há muito de nós escondido, que ilumina – ou materializa! – um palácio final um palácio final onde podemos coexistir em paz.
  • Mas como reagiriam os outros habitantes da cidade, no mundo que flui de outro modo? A luz seria intensa e quente ao início, mas tremeluziria até se apagar, levando consigo o castelo. Seria como queimar o sítio a que sempre chamamos de casa, onde brincávamos tão inocentemente em crianças. destruindo toda a esperança de segurança para sempre.
  • Mas como reagiriam os outros habitantes da cidade, no mundo que flui de outro modo? A luz seria intensa e quente ao início, mas tremeluziria até se apagar, levando consigo o castelo. Seria como queimar o sítio a que sempre chamamos de casa, onde brincávamos tão inocentemente em crianças. destruindo toda a esperança de segurança para sempre.
Grande revelação

0. Epílogo

  • O rapaz disse à rapariga para o seguir e pegou na mão dela. Ele iria protegê-la. Eles iriam fugir deste castelo opressivo, combatendo as criaturas feitas de fumo e dúvida, fugindo para uma vida de liberdade.

    O rapaz queria proteger a rapariga. Ele pegava-lhe na mão ou punha o braço à volta dos seus ombros, para a ajudar a sentir-se apoiada e perto de si no meio da multidão impessoal de Manhattan. Viraram e seguiram em direcção à estação de metro de Canal St., por um caminho por entre a multidão.
  • O seu braço pesava fortemente nos ombros dela, um impeditivo à volta do seu pescoço. “Estás a sobrecarregar-me com a tua necessidade ridícula”, disse ela. Ou, disse ela: “Vais pelo caminho errado e estás a arrastar-me contigo.” Noutra hora, noutro sítio, disse ela: “Pára de puxar o meu braço; estás a magoar-me!”
  • Ele fez cálculos com a sua régua e o compasso. Inferiu. Deduziu. Ele investigou a queda de uma maça, a torção de esferas de metal penduradas por um fio. Ele procurava a Princesa e não iria parar até encontrá-la, pois estava faminto. Ele cortou ratazanas em bocados para examinar os seus cérebros, implantou suportes de tungsténio nos crânios de macacos sedentos.
  • Espiritualmente, ele estava mesmo à sua frente e olhava-o nos olhos. “Estou aqui,” disse ela. “Estou aqui. Quero tocar-te. Olha pra mim!” suplicou ela. Não valia a pena. Ele não a conseguia ver. Só sabia olhar para o lado de fora das coisas.
  • Ele investigou a queda de uma maça, a torção de esferas de metal penduradas por um fio. Através destas pistas iria encontrar a Princesa, ver o seu rosto. Após uma noite particularmente agitada, ajoelhou-se atrás de um bunker no deserto, pôs os binóculos à frente dos olhos e aguardou.

Naquele momento a eternidade ficou suspensa. O tempo parou. O espaço reduziu-se ao mínimo. Parecia que a terra se tinha aberto e os céus se tinham rasgado. Ele sentiu-se um privilegiado por ter testemunhado o Nascimento do Mundo…¹

Robert Jay Lifton’s The Broken Connection


Alguém perto de si disse: “Funcionou.

Outra pessoa disse: “Agora somos todos filhos da mãe.

  • Ela manteve-se altiva e majestosa. Irradiava fúria. Gritou: “Quem me perturbou?” Mas após pespejar toda a cólera, ela sentiu a tristeza que jazia debaixo; deixou a sua respiração acalmar suavemente, como um suspiro, como cinzas a esvoaçarem ao vento.

    Ele não conseguia compreender porque é que ele tinha escolhido brincar tão de perto com a morte do mundo.
  • A loja de guloseimas. Tudo o que ele queria estava do outro lado da montra (vitrine). A loja estava decorada com cores vivas e os aromas no ar enlouqueceram-no. Tentou correr para a porta ou aproximar-se da montra, mas não conseguiu. Ela deteve-o com grande força. Porque haveria ela de o deter? Como poderá ele libertar-se dela? Ponderou a violência.
  • Eles já tinham estado nos seus passeios diários. Ela não ligava ao seus gritos ou à forma como ele puxava dolorosamente a sua trança para que parasse. Ele era pequeno demais para aprender.

    Ela levantou-o e abraçou-o: “Não, querido.” disse ela. Ele tremia. Ela seguiu o seu olhar em direcção aos doces sobre as almofadas atrás da montra (vitrine): o chocolate e o monopolo magnético, o Tudo-ou-Nada e o Cálculo Ético e muitas outras coisas, no seu interior. “Talvez quando fores mais velho, querido”, sussurrou ela, pondo-o no chão e levando-o para casa. “Talvez quando fores mais velho.”

    Todos os dias que seguiram, tal como antes, ela levava-o num percurso que passasse em frente à loja de guloseimas.
  • Ele não pode dizer que tenha compreendido tudo isto. Provavelmente está mais confuso agora do que antes. Mas todos estes momentos que contemplou, algo aconteceu. Os momentos caem na sua mente como pedras. Ajoelhando-se, aproxima-se da mais próxima, passa a mão e acha-a suave e ligeiramente fria.
  • Ele analisa o peso da pedra. Acha que a pode levantar e às outras também. Encaixa-as de modo a contruir uns alicerces, um talude, um castelo.
  • Para construir um castelo do tamanho adequado, precisará de muitas mais pedras. Mas o que tem agora, parece-lhe um início aceitável.